domingo, 26 de maio de 2019

O PADEIRO


Tomo o meu café com pão dormido, que não é tão ruim assim. E enquanto tomo café vou me lembrando de um homem que conheci antigamente. Quando vinha deixar o pão à porta do apartamento ele apertava a campainha, mas, para não incomodar os moradores, avisava gritando:


– Não é ninguém, é o padeiro!

Interroguei-o uma vez: como tivera a ideia de gritar aquilo? Então você não é ninguém?

Ele abriu um sorriso largo. Explicou que aprendera aquilo de ouvido. Muitas vezes lhe acontecera bater a campainha de uma casa e ser atendido por uma empregada ou outra pessoa qualquer, e ouvir uma voz que vinha lá de dentro perguntando quem era; e ouvir a pessoa que o atendera dizer para dentro: “não é ninguém, não senhora, é o padeiro”. Assim ficara sabendo que não era ninguém…

Ele me contou isso sem mágoa nenhuma, e se despediu ainda sorrindo.
 (Rubem Braga. Ai de ti, Copacabana, Crônicas. Editora do autor, Rio de Janeiro, 1960)
FONTE: portuguesirado.com.br/v2019/2015/09/19/texto-para-interpretacao-90-o-padeiro-nivel-fundamental/

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